Hesitei muito em escrever sobre o “meu” Caminho de Santiago. Mas, caiu-me na lembrança o título do livro de Eduardo Galeano, falecido escritor uruguaio – As veias abertas da América Latina. Este título ficou tilintando na minha cabeça. Até que, um belo dia, ele se encaixou nas minhas experiências do Caminho de Santiago. Então, motivada pelo título, eis-me aqui para compartilhar uma pequena fração do que vivenciei em sete dias de caminhada.
Primeiro dia! Uhulll! Saltitante e feliz dei os passinhos inicias. Só curtindo. Sobe e desce, pedra, pasto, vaca, café, albergue, caminhantes, mais vaca e pasto, carimbo, e muitas setas amarelas. Muitos peregrinos – os calados, os falantes, os cantantes, os mal humorados, os festeiros, uns poucos à moda antiga e tantos outros. Mas, não demorou muito, fui acometida por um estrondoso Ué! Cadê o Caminho que dizem ser Santo? Mas é isso? A cada passo me questionava sobre qual seria o sentido disso tudo. Fé? Turismo? Festa? Espetáculo? Comércio? Férias? Não conseguia me situar e muito menos entender o que estava acontecendo ao meu redor. Respostas, por favor!
No dia seguinte resolvi caminhar sozinha – eu e eu do meu lado. E conto a vocês: Brigamos feio! Um turbilhão de emoções aflorou: raiva, medo, ciúmes, culpa, ansiedade, auto-piedade, além de uma angústia sem fim. Abri o choro durante vários quilômetros. Sangrava. Óculos escuros e lenço na função. Depois, mais calma, segui em absoluto silêncio. Por fim, concentrei-me em agradecer à Divina Providência por estar exatamente onde estava e clamei por luz e equilíbrio para os próximos dias. Estava desolada.
Mais um dia. Com muita chuva, segui sozinha. Mas, a bota começou a conversar sério comigo. Outra briga. E é nessas horas que surgem os anjos para ajudar e aliviar a dor. Tira! Arruma assim! Vai devagar! Põe isso! Por fim, a sandália me salvou. Segui sem dor no pé. Mas no coração…! O dia anterior havia sido somente uma degustação do que estava por vir. Como os anjos seguiram o meu lado, adiei a batalha. Noites longas. Muito frias ou muito quentes. Como não fujo à luta, não via a hora de levantar e, ainda com o frescor da manhã, me jogar na trincheira e travar combate. Estava aflita.
E assim se passaram os primeiros dias: em batalha no front.
E, como não há mal que sempre dure, de repente e sem mais delongas, envolvida em absoluto silêncio, Ah! O tão necessário silêncio!, tudo se descortinou. Uma explosão de sentimentos bons revelaram as cores do verdadeiro Caminho de Santiago. A paisagem se mostrou exuberante, com seus sons e cheiros. Os peregrinos apresentaram novos semblantes. O céu parecia mais azul. O sol… Bem, este estava quente mesmo! Mas, o que me emocionou de verdade foi pensar que, durante séculos, milhares de peregrinos deixaram um pedacinho de sua história nesse mesmo lugar onde eu estava pisando. Cada um travando sua própria batalha, em busca do seu Caminho interior. #tamojunto,pensei.
Confirmei o dito de que o Caminho é mais emoção do que ralação. Chorei muito. Entreguei-me à infinita compaixão por todos os homens que buscaram e os que ainda buscam a transformação. A partir desse momento, meu coração seguiu leve e tranquilo e o Caminho de Santiago passou a fazer sentido para mim.
A grande lição? Abrir-me (As veias abertas…) e aguardar em silêncio. As respostas surgem como por encanto.
Hoje, com muita gratidão, reverencio cada trecho do Caminho de Santiago de Compostela e admiro todos aqueles buscaram e buscam o seu verdadeiro sentido. Obrigada a todos que me antecederam e que moldaram o Caminho tal como o encontrei. Obrigada a todos que estiveram comigo nesse Caminho, preparando-o para aqueles que virão.
Recomendação? Faça o Caminho! Todos! Como? Abrindo seu coração para receber cada dádiva que o Caminho oferece.
Lindo!Lindo! Lindo!
Sou seu fã, Angélica!!!!
Obrigada, Papael. Você foi parte desse Caminho.
Só corrigindo: e ainda é, pois o Caminho nunca termina.
Legal Angélica…foram fortes emoções….jamais esquecerei o dia da chuva em que tb fiz questão de ficar sózinho e me senti como o tenente Dan ( lembra dele??? do filme Forrest Gum na cena da tempestade em que ele sem as pernas sobe no mastro do barco pesqueiro e despeja toda a sua ira que tinha contra Deus e após a tempestade ele finalmente agradece a Forrest por te-lo salvo no Vietnan)…No dia da chuva lavei a minha alma…pensei…refleti…..e ao invés de brigar com Deus eu o agradeci por estar ali naquele momento com fome, molhado mas vivo…….rs….. Obs:- Caminhamos um trecho justo e tb foi muito legal…..rs…conversamos e rimos bastante….uma grande experiencia e que repetirei no ano que vem…Um abração…Constantino…
Querido Constantino. Oh! Se me lembro da nossa caminhada juntos. O tal dia da chuva…
Também repetirei este Caminho.
Abraço
Lindo Amiga! Me emocionei lembrando que fizemos a ultima etapa juntas e conversamos sobre estas indagações.
Voce mora no meu coração.
Ione querida. Quanta emoção!. E você, mesmo em outro trecho, estava sempre junto.
Você também mora no meu coração.
Maravilhoso, Angélica! Descreveste tão bem o Caminho que me vi refazendo teus passos e sentindo as emoções que sentiste. Amei!
Alba, querida. Obrigada pelo carinho. Você é muito querida e amiga.
Muito lindo seu depoimento, obrigado por compartilhar!
Acho que sei exatamente o significado de cada palavra sua!
Texto perfeito, quem sabe não há uma “veia” de escritora escondidinha por aí?
Seve, querido Peregrino. Obrigada pelo carinho. Posso imaginar como foi o seu Caminho. Creio que somente os fortes o fazem sozinho. Admiro a sua coragem e determinação.
Que delicia de depoimento, com tanta abertura e clareza d’alma. Gratidão, Angelica. Farei breve o caminho.
Querida Laura. Você é sua rosinha irão adorar o Caminho. Muita diversão e emoção para vocês. Buen camino!
Nunca havia pensado em fazer o caminho, mas você e Marinez Veiga me inspiraram… não sei quando vou, só sei que irei um dia… obrigada por compartilhar sua experiência. Te admiro muito. Bjussss