Acordar em meio ao Campo de Gelo era um sonho! Queria degustar cada momento e não conseguia esconder o meu entusiamo pelo privilégio de estar ali! Cheguei a esquecer por alguns minutos que tinha uma tempestade a caminho.
Quinto dia: 15/01/2018
Apesar do esforço do dia anterior, o mais difícil da travessia, estava me sentindo bem. Desfizemos o acampamento bem mais rápido do que montamos: Era hora de partir!
Arrumadas as mochilas, calçamos o pé de pato, ops, raquetes (risos) para depois nos encordarmos e seguir caminhando. Ainda bem que o meu quarteto saiu por último e pude apreciar o primeiro pelotão caminhando pelo gelo, indo longe.
Não demorou muito lá estávamos nós: Jere liderando o quarteto, Dani, eu e, fechando a equipe estava Manu. A caminhada foi em ritmo acelerado do início ao fim. Durante toda a caminhada conversei com minhas unhas, que ficaram muito magoadas, inclusive algumas me deixaram – se é que me entendem!
Aliás, não dá para esquecer o protetor solar. O gelo queima até os olhos. Eu que detesto usar óculos de sol, não tirava o meu, que além de lentes apropriadas, tinha proteção lateral!
Ao longo da caminhada a neve do Campo de Gelo foi se modificando, ficando cada vez mais dura, também as gretas foram aumentando em quantidade e tamanho. Todo cuidado era pouco, pois estávamos saindo da área de “acumulação” de gelo para entrar na área de “ablação”, onde a perda de água é mais elevada do que a acumulação. Era o início do Glaciar Viedma, o maior glaciar argentino.
Trocamos as raquetes pelos crampões e fomos nos aproximando da morena lateral para sair do Campo de Gelo. Aliás, sair do Campo de Gelo foi infinitamente mais fácil que entrar. Será que seria tão fácil assim?
Morenas: “São depósitos produzidos pelas geleiras quando se deslocam. O gelo transporta fragmentos de várias dimensões, mas ele, ao se atritar com rochas maiores, vai depositando esses fragmentos.”
Estávamos exatamente ao meio dia com toda equipe reunida e pudemos nos desencordar para seguir mais livres pela morena, com suas pedras soltas e paisagem árida. Passamos por alguns lagos e, dada as condições extremas ali, sem nenhuma vegetação.
Chegamos ao novo acampamento junto à Laguna de Los Esquies com bom tempo. Nesses ambientes o companheirismo é fundamental. Quando todos do grupo ajudam, não importa quem é contratado ou contratante, mais rápido todos podem se abrigar e descansar. Armamos as barracas, pegamos água e antes de tomar o mate desci mais uma vez ao lago para lavar o rosto e ficar sozinha por alguns minutos. Pensei até que a tempestade iria passar longe e esquecer-se da gente. Doce ilusão!
A ventania começou e não parou mais. Tivemos que jantar na barraca mesmo e desta vez o macarrão veio crocante, pois tinha pó de pedra por tudo. O vento estava implacável!
A noite chegou e com ela a chuva. Ela se atrasou , mas chegou: A tempestade!
Sexto dia: 16/01/2018
Choveu e ventou a noite toda. Nossa barraca, das 3 meninas, era a mais protegida: Estava ao lado de uma imensa pedra e um muro pedras. Mesmo assim a barraca balançou a noite toda.
Lembram do Jaison, o coreano? Ele insistiu em usar sua própria barraca, mas ela não era apropriada para aquele clima tão inóspito. Naquela noite tudo que ele tinha molhou e ele não conseguiu dormir nada. Foi massageado pelo vento a noite toda.
Não foi só o Jaison que teve problemas. As cordas da barraca do Manu e Juan romperam com a força do vento e eles também não tiveram uma boa noite de sono, tentado arrumar o estrago.
Amanheceu e continuava a ventar e chover. Tente imaginar o que era ir ao banheiro nessa situação… Pelo menos estávamos em três mulheres rindo uma das outras!
Pensei que iríamos passar mais uma noite ali, pois já passavam das 10h da manhã. Será que teria mais um chá de barraca?
Chuva foi dando uma trégua, o vento foi amenizando. Opa era a janela que precisávamos para sair dali e seguir para o Laguna del Refúgio, caminho para o Passo Huemul o qual teríamos que cruzar no dia seguinte. Não tínhamos mais folga no cronograma.
Quem acha que Curitiba tem todas as estações do ano num dia só é que não conhece o clima no Campo de Gelo.
Saímos do acampamento com o tempo brusco, mas em pouco um céu azul descortinou e o caminho foi se transformando em uma bela paisagem com plantas rasteiras, margaridas e riachos de águas cristalinas.
A chegada ao nosso novo acampamento foi uma festa! Ele localizava-se em numa depressão formada por uma morena, protegido do vento e havia um grande gramado em volta do lago. Tínhamos até uma cabana para cozinhar! Yupiiii… o paraíso tem muitas formas mesmo!
Ficamos o resto da tarde estirados ao sol, jogando conversa fora, tomando um mate e relaxando! Tivemos até um aperitivo de linguiça e queijo. Incrível como o tempo mudou, para alegria de todos!
Foi a segunda vez que pudemos ficar todos juntos conversando na mesma roda. Nem me preocupei com o que me esperava no dia seguinte…